Houve divergência sobre o alcance da medida, mas prevaleceu posição de
manter no STF somente os processos de crimes cometidos durante o mandato e
relacionados ao exercício do cargo.
O Supremo
Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quinta-feira (3) reduzir o alcance do foro
privilegiado de deputados e senadores somente para aqueles processos sobre
crimes ocorridos durante o mandato e relacionados ao exercício do cargo
parlamentar.
Com a decisão,
deixarão o Supremo Tribunal Federal parte dos cerca de 540 inquéritos e ações
penais em tramitação, segundo a assessoria do STF.
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Perguntas e respostas sobre foro privilegiado; entenda.
Caberá ao
ministro-relator de cada um desses inquéritos ou ações analisar quais deverão
ser enviados à primeira instância da Justiça por não se enquadrarem nos novos
critérios. "Eu acho que cada relator [poderá decidir] individualmente. Não
vai precisar trazer mais para o plenário", explicou o ministro Luís Roberto Barroso, relator da ação na
qual se baseou a decisão desta quinta do STF.
O foro por
prerrogativa de função, o chamado "foro privilegiado", é o direito
que têm deputados e senadores – entre outras autoridades, como presidente e
ministros – de serem julgados somente pelo Supremo. Atualmente, qualquer ação
penal contra esses parlamentares, mesmo as anteriores ou as não relacionadas ao
mandato, são transferidas das instâncias judiciais em que tramitam para o STF.
Durante o
julgamento, que começou em maio do ano passado, os ministros também fixaram o
momento a partir do qual uma ação contra um parlamentar em tramitação no STF
não pode mais sair da Corte: na hipótese de ele deixar o mandato numa tentativa
de escapar de uma condenação iminente, por exemplo.
Pela decisão, o
processo não deixará mais o STF quando se alcançar o final da coleta de provas,
fase chamada “instrução processual”, na qual o ministro intima as partes a
apresentarem suas alegações finais.
Assim, se um
político que responda a processo no STF (por ter cometido o crime no cargo e em
razão dele) deixar o mandato após a instrução, por qualquer motivo, ele deverá
necessariamente ser julgado pela própria Corte, para não atrasar o processo com
o envio à primeira instância.
Divergências
Durante o
julgamento, surgiram três posições:
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Uma, apresentada pelo ministro Luís Roberto Barroso,
de restringir o foro privilegiado de deputados e senadores aos crimes cometidos
no exercício do mandato e relacionados ao cargo. Sete ministros aderiram a essa
posição (Barroso, Luiz Fux, Edson Fachin, Cármen Lúcia, Celso de Mello, Rosa
Weber e Marco Aurélio Mello).
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Outra, do ministro Alexandre de Moraes, de
manter no STF todos os processos de crimes cometidos por deputados e senadores
durante o mandato mesmo que não tenham relação com o cargo. Dois ministros
ficaram com essa posição (o próprio Alexandre de Moraes e Ricardo Lewandowski).
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Uma terceira, a
partir de um ajuste do voto do ministro Dias Toffoli, prevê
estender a todas as autoridades que tenham prerrogativa de julgamento em
instâncias superiores – e não só a deputados e senadores – a restrição ao foro
privilegiado. Além de Toffoli, Gilmar Mendes também se manifestou a favor dessa
posição.
O julgamento
começou em maio do ano passado, foi interrompido duas vezes e retomado nesta
semana, com duas sessões, nestas quarta (2) e quinta (3).
Votos dos ministros
Saiba quais
argumentos cada ministro utilizou para justificar o voto:
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Luís Roberto
Barroso - Em seu
voto, em maio do ano passado, o ministro Luís Roberto Barroso disse que a atual
regra leva muitos processos à prescrição – quando a demora no julgamento
extingue a punição – porque cada vez que um político muda de cargo, o processo
migra de tribunal, atrasando sua conclusão. “A prática atual não realiza
adequadamente princípios constitucionais estruturantes, como igualdade e
república, por impedir, em grande número de casos, a responsabilização de
agentes públicos por crimes de naturezas diversas. Além disso, a falta de
efetividade mínima do sistema penal, nesses casos, frustra valores
constitucionais importantes, como a probidade e a moralidade administrativa”,
disse no voto.
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Alexandre de
Moraes - Em
novembro, quando o julgamento foi retomado, Alexandre de Moraes, primeiro a
votar na sessão, reconheceu a “disfuncionalidade” da atual regra, por gerar um
“sobe e desce” de processos pelas sucessivas mudanças de instâncias, levando ao
risco da prescrição. O ministro defendeu que permaneçam no STF somente os
processos sobre crimes cometidos durante o mandato, mesmo que não tenham
relação com o cargo. Para ele, uma restrição mais abrangente, como propôs
Barroso, dependeria de uma alteração na Constituição pelo Congresso. “O juízo
natural dos congressistas que pratiquem infrações penais comuns – todos os
tipos de infração independentemente de estarem ou não ligadas à função –, é o
Supremo Tribunal Federal [...] A finalidade protetiva do foro é possibilitar
que do momento em que eles foram diplomados até o momento em que acabou o
mandato, eles não sofram perseguições”, disse.
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Luiz Fux - Acompanhou a proposta de Barroso, para tirar do STF também ações
sobre delitos cometidos durante o mandato, mas sem relação com o cargo. “Ora o
candidato exerce um cargo, ora exerce outro. Quando o processo baixa, ele não
anda. Se ele baixa e não anda, quando ele voltar já está prescrito. Então é
preciso que efetivamente que ele tenha um juízo próprio e que o Supremo seja
reservado somente para os ilícitos praticados no cargo e em razão dele”,
afirmou.
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Edson Fachin - Relator dos processos da Operação Lava Jato, Edson Fachin
argumentou que o foro privilegiado deve valer para atos ligados ao mandato
parlamentar, que se destina à elaboração de leis, fiscalização dos outros
poderes e debate de ideais. “O próprio Supremo Tribunal Federal tem admitido
que a regra de imunidade não é absoluta devendo relacionar-se ao estrito
desempenho das funções típicas do Congresso Nacional”, afirmou.
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Celso de Mello - Mais antigo integrante do STF, Celso de Mello também defendeu a
restrição, argumentando que os juízes de primeira instância são capazes de
julgar deputados e senadores. "Eu pessoalmente atuei durante 20 anos como
membro do ministério Público perante magistrados de primeira instância e posso
atestar a seriedade, a responsabilidade, a independência com que esses agentes
públicos atuam”, disse.
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Cármen Lúcia - A presidente da Corte, Cármen Lúcia, que votou em junho pela
restrição do foro, criticou “manobras” que políticos fazem para mudar de tribunal.
“Nós chegamos aqui à situação em que um deputado renunciou para que nós não
pudéssemos julgar, mas não dá mais para o Supremo ficar permitindo manobra que
impeça que o julgamento aconteça. Eu, como cidadã me sinto e todo brasileiro se
sente numa sociedade em que impunidade prevalece em razão de situações como
essa”, disse.
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Marco Aurélio
Mello - Ainda
em junho, Marco Aurélio Mello também defendeu o foro só para crimes ligados ao
cargo. "Se digo que a competência é funcional, a fixação, sob o ângulo definitivo,
ocorre considerado o cargo ocupado quando da prática delituosa, quando do
crime, e aí, evidentemente, há de haver o nexo de causalidade, consideradas as
atribuições do cargo e o desvio verificado", afirmou.
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Rosa Weber - A ministra defendeu o mesmo critério, lembrando que o foro foi
se ampliando a cada nova Constituição. “O instituto do foro especial, pelo qual
não tenho a menor simpatia, mas que se encontra albergado na nossa
Constituição, só encontra razão de ser na proteção à dignidade do cargo, e não
à pessoa que o titulariza”, disse.
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Dias Toffoli – Ao votar, optou pela fórmula de Moraes para deixar no STF os
casos ocorridos durante o mandato, mesmo sem relação com o cargo. Disse
tratar-se de um parâmetro objetivo e preciso. Para ele, se o STF também
derrubasse o foro para delitos cometidos sem relação com o mandato, essa
ligação poderia ser objeto de interpretação, dando margem a subjetividade para
a definição. “Essa análise terá que ser feita pelo próprio STF, a quem compete
definir se o processo permanece no Tribunal ou desce para a primeira instância,
o que certamente paralisará investigações em curso e, o pior, poderá gerar
nulidades em investigações e processos já iniciados”, disse.
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Ricardo
Lewandowski - Também
votou em favor da restrição do foro privilegiado para parlamentares abrangendo
todos os delitos cometidos durante o mandato. Para ele, a fórmula conserva a
garantia concedida aos deputados e senadores pela Constituição. “Esta solução
protege o parlamentar contra ação de natureza temerária que possa eventualmente
tisnar ou dificultar o pleno exercício do mandato”, disse o ministro.
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